quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Curitiba, 33 graus

Rodrigo Wolff Apolloni
Há muito tempo, filósofos e cientistas teorizam a respeito da influência do clima sobre os hábitos e o psiquismo das pessoas. Eu, de fato, não sei o que pensar. Culpa do calor. Sei apenas que, nos últimos dias, a coisa anda meio esquisita por estes lados do mundo.
Curitiba, 33 graus. Sensação térmica de 50. Sufoco e água de coco. Pernas brancas de fora, fosforescentes, tão belas, ou meio esverdeadas como as minhas, em sua bermuda de turista da Alemanha Oriental.
Curitiba, 33 graus. Choque tectônico na Avenida Iguaçu, provocado, segundo alguns, pela imprevidência em relação à impensável hipótese saariana. Culpa da dilatação dos materiais e dos centímetros que faltavam na fresta entre uma placa e outra. Estranho, como na hipótese de que um dragão chinês, encalorado, tenha coleado junto à superfície em busca de frescor.
Curitiba, 33 graus. Suor escorrendo sobre o teclado, prejudicando a crônica de terça-feira e alimentando as bobagens deixadas no Facebook a respeito do calor.
Curitiba, 33 graus. Jamais suspeitei de que, um dia, usaria a pa­­la­vra “canícula” em um texto literário. Nem “senegalesco”. Aí está.
Curitiba, 33 graus. A mulher dorme na sala, levando consigo o ventilador e deixando comigo as gatas da casa... que não sentem calor.
Curitiba, 33 graus. No Gaúcho ou na Formiga, sorvetes são vendidos aos milhares. Vingança do gelo sobre o fogo, ou do fogo sobre o inverno eterno que, por longos meses, há milênios, nos aflige.
Curitiba, 33 graus. Nas ruas do Centro, cones plásticos e estagiários com orwellianas placas de “Pare” e “Siga” esperam os ciclistas e olham, abatidos, para o asfalto que se liquefaz.
Curitiba, 33 graus. Céu cinzento e relâmpagos ao cair da noite. E a chuva que não vem.
Curitiba, 33 graus. Alegria molhada, pré-carnavalesca, no Largo da Ordem. Sufocada, às nove da noite, por uma explosão de fúria, exatamente como no filme de Spike Lee.
Curitiba, 33 graus. É bem possível que, ao ler este texto, você esteja de pulôver e com saudades do dia de ontem, que foi tão aprazível. Sonho de Rio de Janeiro. Curitiba, 13 graus.

Publicado originalmente no jornal Gazeta do Povo em 07/02/2012

Nenhum comentário: